texto de José Luís Gonçalves*
Com certeza que há ‘culpados’ na situação crítica em que nos encontramos como país, mas há, sobretudo, uma corresponsabilidade coletiva a partilhar: enclausurados nas ilusões do “mercado”, não percebemos a tempo as exigências que as profundas mudanças socioeconómicas nos colocavam pessoal e coletivamente: em poucas décadas passamos de um sociedade segura para uma sociedade de risco, vulnerável e precária. Embalados pela vertigem assistencialista, repousamos na solidez do “Estado de Bem-estar”, desligando-nos das instâncias sociocomunitárias de proximidade (associações e comunidades) e privadas (família), perdendo progressivamente o vínculo social e desistindo de procurar as razões que nos unem uns aos outros. Fechados num individualismo descomprometido, procuramos viver a ‘nossa liberdade’ em estilos de vida alternativos, redefinindo, assim, pertenças e lugares, e, com isso, também identidades: para nós, vale o que é útil e funciona. Nas últimas semanas esta mentalidade utilitária ganhou maior expressão na comunicação social onde o acontecimento se sobrepõe ao argumento e a urgência do uso público da razão tende a esfumar-se por entre as reivindicações mesquinhas de partidos e grupos que vão esgotando a esperança em projetos de vida alternativos. O reverso da medalha está à vista: desamparo, solidão, vulnerabilidade, exposição à exclusão, desilusão, desesperança… Este é o preço a pagar por uma pseudo-liberdade e cidadania vividas sem vínculo ou laço social! Por interesse ou comodismo, desligámo-nos uns dos outros!
Vivemos um tempo desafiador neste momento de vida coletiva: acreditar e refundar as razões para viver em comum é, agora, decisivo! Em tempos de incerteza social e de escassez de recursos, o desafio coletivo que enfrentamos pode formular-se nestes termos: como obter um equilíbrio entre a promoção da equidade (do que é justo para todos) e do reconhecimento (do que é válido para cada um)? Para estarmos de acordo sobre o que é justo e válido temos de ser capazes de redescobrir o que é o bem-comum! E o bem-comum só se descobre quando se está ligado vitalmente ao vizinho do prédio ou da rua, à comunidade de referência ou ao colega de trabalho por vínculos de sociabilidade que façam sentido. A noção de bem-comum – que não consiste na simples soma dos interesses particulares –, pressupõe o conjunto de condições da vida que possibilita aos grupos e a cada um dos seus membros o seu desenvolvimento integral.
Perante as opções políticas tradicionais de direita e esquerda, expressas, respetivamente, na dicotomia “mais Mercado” vs. “mais Estado”, devemos propor, então, “mais Sociedade Civil”. Em tempos de crise de confiança nos atores tradicionais da esfera pública (políticos, banqueiros, grupos corporativos…) só esta é capaz de instituir uma ação política que estabeleça referências suscetíveis de dar sentido e emprestar uma visão coerente e de futuro ao destino coletivo. Só um movimento de cidadania, a acontecer a partir das iniciativas dos grupos e associações de bairro, das comunidades de vizinhança, das ONG, IPSS, Igrejas, etc. é capaz de transformar atavismo e inércia em participação qualificada. Precisamos de reinventar as razões de vida em comum, redescobrir o que nos une, reinventar novas formas e modelos de convivência, de escuta, de diálogo sereno, de ação comum eficaz… Carecemos de práticas de cidadania alicerçadas em laços humanos diferenciadores: ainda que não sejam sólidos e definitivos, mas que sejam, contudo, conscientes e significativos. Dito de outra forma, necessitamos ligar ‘pessoas’ e ‘lugares’, dinamizando zonas de interação comuns, produzir lugares/tempos de encontro, visando a construção de uma solidariedade de razões que leve à criação de respostas criativas e inéditas de vida em comum, através dos valores da proximidade, de cidadania e de comunidade fomentadoras da coesão social.
*diretor da Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti, Porto, 12 abril 2011
Com certeza que há ‘culpados’ na situação crítica em que nos encontramos como país, mas há, sobretudo, uma corresponsabilidade coletiva a partilhar: enclausurados nas ilusões do “mercado”, não percebemos a tempo as exigências que as profundas mudanças socioeconómicas nos colocavam pessoal e coletivamente: em poucas décadas passamos de um sociedade segura para uma sociedade de risco, vulnerável e precária. Embalados pela vertigem assistencialista, repousamos na solidez do “Estado de Bem-estar”, desligando-nos das instâncias sociocomunitárias de proximidade (associações e comunidades) e privadas (família), perdendo progressivamente o vínculo social e desistindo de procurar as razões que nos unem uns aos outros. Fechados num individualismo descomprometido, procuramos viver a ‘nossa liberdade’ em estilos de vida alternativos, redefinindo, assim, pertenças e lugares, e, com isso, também identidades: para nós, vale o que é útil e funciona. Nas últimas semanas esta mentalidade utilitária ganhou maior expressão na comunicação social onde o acontecimento se sobrepõe ao argumento e a urgência do uso público da razão tende a esfumar-se por entre as reivindicações mesquinhas de partidos e grupos que vão esgotando a esperança em projetos de vida alternativos. O reverso da medalha está à vista: desamparo, solidão, vulnerabilidade, exposição à exclusão, desilusão, desesperança… Este é o preço a pagar por uma pseudo-liberdade e cidadania vividas sem vínculo ou laço social! Por interesse ou comodismo, desligámo-nos uns dos outros!
Vivemos um tempo desafiador neste momento de vida coletiva: acreditar e refundar as razões para viver em comum é, agora, decisivo! Em tempos de incerteza social e de escassez de recursos, o desafio coletivo que enfrentamos pode formular-se nestes termos: como obter um equilíbrio entre a promoção da equidade (do que é justo para todos) e do reconhecimento (do que é válido para cada um)? Para estarmos de acordo sobre o que é justo e válido temos de ser capazes de redescobrir o que é o bem-comum! E o bem-comum só se descobre quando se está ligado vitalmente ao vizinho do prédio ou da rua, à comunidade de referência ou ao colega de trabalho por vínculos de sociabilidade que façam sentido. A noção de bem-comum – que não consiste na simples soma dos interesses particulares –, pressupõe o conjunto de condições da vida que possibilita aos grupos e a cada um dos seus membros o seu desenvolvimento integral.
Perante as opções políticas tradicionais de direita e esquerda, expressas, respetivamente, na dicotomia “mais Mercado” vs. “mais Estado”, devemos propor, então, “mais Sociedade Civil”. Em tempos de crise de confiança nos atores tradicionais da esfera pública (políticos, banqueiros, grupos corporativos…) só esta é capaz de instituir uma ação política que estabeleça referências suscetíveis de dar sentido e emprestar uma visão coerente e de futuro ao destino coletivo. Só um movimento de cidadania, a acontecer a partir das iniciativas dos grupos e associações de bairro, das comunidades de vizinhança, das ONG, IPSS, Igrejas, etc. é capaz de transformar atavismo e inércia em participação qualificada. Precisamos de reinventar as razões de vida em comum, redescobrir o que nos une, reinventar novas formas e modelos de convivência, de escuta, de diálogo sereno, de ação comum eficaz… Carecemos de práticas de cidadania alicerçadas em laços humanos diferenciadores: ainda que não sejam sólidos e definitivos, mas que sejam, contudo, conscientes e significativos. Dito de outra forma, necessitamos ligar ‘pessoas’ e ‘lugares’, dinamizando zonas de interação comuns, produzir lugares/tempos de encontro, visando a construção de uma solidariedade de razões que leve à criação de respostas criativas e inéditas de vida em comum, através dos valores da proximidade, de cidadania e de comunidade fomentadoras da coesão social.
*diretor da Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti, Porto, 12 abril 2011
Muito oportuno! Propostas construtivas que mobilizam o que há de melhor em nós...
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